Pesquisa de médica acreana pode revolucionar tratamento da malária

Uma pesquisa científica coordenada pela doutora em Saúde Pública Suiane Negreiros, sobre a malária Plasmodium vivax, deverá fomentar debates em relação ao tratamento da doença no país e nas Américas. O estudo, em forma de artigo, foi divulgado recentemente pela The New England Journal of Medicine, uma revista de alcance mundial e de maior impacto no meio científico.       

Com doutorado pela USP, Suiane é médica da Secretaria de Estado de Saúde do Acre (Sesacre).  

Intitulada “Dose mais alta de primaquina para prevenir a recaída da malária por Plasmodium vivax”, a pesquisa contou com a colaboração de pesquisadores do Instituto Evandro Chagas, no Brasil, e de instituições dos Estados Unidos, além do Ministério da Saúde. 

Realizado em oito postos de diagnóstico de malária em Cruzeiro do Sul, no Acre, o estudo avaliou três esquemas de dosagens de primaquina, medicamento usado para o tratamento da malária. O objetivo era avaliar a prevenção de recaída da doença por Plasmodium vivax, tanto em adultos como em crianças com pelo menos 5 anos de idade.

Os pacientes receberam cloroquina por três dias. Constatou-se que o uso de primaquina administrada na dose total de 7,0 mg/kg obteve maior eficácia terapêutica na prevenção de recaída da malária por Plasmodium vivax do que a dosagem atualmente recomendada (3,5 mg/kg).

Com isso, a proporção de pacientes que não apresentaram episódios de recaídas no período de seis meses, após a infecção inicial, subiu para 86%, contra 59% daqueles que receberam o tratamento com dose mais baixa de primaquina.

“Acho importante pontuar que os resultados desse estudo podem contribuir para a sociedade brasileira, no sentido de fomentar a possível revisão do tratamento da malária vivax no Brasil e nas Américas”, disse Suiane.

Bastidores

Em um segundo artigo publicado pela The New England Journal of Medicine, desta vez sobre os bastidores da pesquisa, a médica Suiane Negreiros conta ter sido contatada pelo Ministério da Saúde em 2016, por meio de um telefonema. As autoridades de saúde do governo federal estavam preocupadas com o avanço da malária na região e queriam saber se os profissionais da área gostariam de colaborar com uma pesquisa sobre a doença.

Apesar da experiência em condução de pesquisas, a proposta tinha outras implicações. “Cruzeiro do Sul, com 85.000 habitantes, é a segunda maior cidade do Estado do Acre, mas fica a 635 km de Rio Branco, capital do estado. Esta viagem pode levar até 24 horas, porque a estrada fica severamente danificada durante a estação chuvosa tropical”, contou Suiane no artigo.

O texto relata ainda que o acesso a produtos de uso diário e suprimentos de laboratório é desafiador e alvo de frequentes atrasos na entrega, além dos altos custos de envio.

Ainda de acordo com o artigo, mais de 80% dos casos de malária na Amazônia brasileira são atribuíveis ao Plasmodium vivax.

O tratamento conta com o uso de dois medicamentos: a cloroquina, para controlar a doença e prevenir a recrudescência, e a primaquina, para prevenir recaídas.

“Na maioria das Américas, incluindo o Brasil, a primaquina é administrado como uma dose total de 3,5 mg/kg durante 7 ou 14 dias. Em um estudo anterior, demonstramos que essa dose tinha 60 a 70% de eficácia na prevenção de recorrências em 6 meses. Nós nos perguntamos então se uma dose total mais alta (7,0 mg/kg), já em uso em outras regiões do mundo, administrado ao longo de 14 dias seria mais eficaz para a prevenção da recaída da malária vivax”, diz o artigo.

“Essa iniciativa vem demonstrar ainda que os pesquisadores da Região Norte têm capacidade para conduzir ensaios clínicos, além de demonstrar a importância das relações internacionais para a pesquisa científica, com a liderança dos colegas brasileiros”, concluiu Suiane. 

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