Quase todo carioca é apaixonado por boteco. Eu, que além de carioca, sou tijucano (a Tijuca é o único bairro do planeta que tem gentílico), sempre tive o hábito de marcar, sempre que possível, tudo ao redor da mesa de bar, de aniversários a reuniões de trabalho. O botequim funciona, para mim, como uma expansão da minha casa ou escritório.
A Tijuca é um dos bairros do Rio, quiça do mundo, que tem mais bar por metro quadrado, quase toda esquina tem um botequim. Na época que precede ao carnaval, em quase todos a trilha sonora é, lógico, o samba.
Naquele sábado de carnaval, estava com uns amigos no bar do seu Zé, na rua Pereira Nunes, que liga a Tijuca a Vila Isabel, quando o Roberto Bigode, atendente do boteco, coloca uma música do Olodum, uma das bandas baianas que mais gosto. Um dos amigos que bebia comigo esbravejou:
– Porra, Bigode, é carnaval, estamos no Rio e não na Bahia, bote um samba de verdade.
– O samba nasceu na Bahia. – Retrucou o baiano Bigode.
– Não fale besteira e coloque um samba de verdade. – Repetiu o amigo.
Lembrei de uma canção do carioca Vinícius de Moraes:
“Porque o samba nasceu lá na Bahia… E se hoje ele é branco na poesia… Se hoje ele é branco na poesia… Ele é negro demais no coração…” (Samba da Benção)
Se procurarmos referências do samba e seus primórdios, encontraremos informações bastantes desencontradas. Há quem afirme que ele nascera na Bahia no século XIX, levado pelos escravos africanos. Por outro lado, há quem diga que ele é um gênero musical e dança com origem na cidade do Rio de Janeiro. Haja controvérsia!
A popularização do samba ocorreu a partir da década de 1930. Foi quando a “elite branca” descobriu a delícia do bom rebolado ao som do batuque. Depois que se tornou popular, outros subgêneros foram surgindo, como o samba-canção, o samba-enredo, a bossa-nova, o samba-de-breque, entre outros.
Pedro Lopes Marinho, professor universitário e estudioso da história da música popular brasileira há mais de 30 anos, finaliza o debate sobre quem é o verdadeiro “pai do samba” afirmando que:
“o samba enquanto dança e rito religioso é genuinamente baiano, mas enquanto gênero musical é profanamente carioca.”
É isso, pouco me importa, enquanto amante de um bom batuque, de um bom requebrado, onde foram as primeiras batidas e rebolados. Se até a história nos deixa confusos, como escreveu Luiz Ayrão na canção, “eu não vou em bola dividida”. Fico com todos os sambas, de todos os sotaques e mando às favas a sua paternidade.
– Bigode, deixa de conversa mole e me traga mais uma cerveja, por favor.