Apesar de ter sido avisado com antecedência do discurso crítico que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dirigiu ao Planalto na tarde de quarta-feira (24), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não gostou do tom adotado pelo parlamentar.
Bolsonaro entendeu que Lira precisava marcar posição por estar pressionado, principalmente, pela classe política, que discordou da nomeação de Marcelo Queiroga para o Ministério da Saúde . O presidente, porém, se surpreendeu ao ouvir, no discurso, uma ameaça velada de impeachment , traduzida no trecho em que Lira diz que há “remédios políticos no Parlamento” que são “fatais” .
Mesmo após a dura fala de Lira, Bolsonaro resiste a demitir o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo , e fez uma força-tarefa na manhã desta quinta-feira (25) para manter o aliado no cargo.
Um dia depois de Lira dizer que Araújo perdeu a capacidade de dialogar com países, o chanceler o procurou nesta manhã para dar explicações sobre a atuação do Itamaraty . Em seguida, Lira esteve no Planalto com Bolsonaro, que mais uma vez tentou blindar o auxiliar.
Interlocutores de Ernesto Araújo minimizaram o encontro nesta manhã com Arthur Lira, dizendo que a visita de cortesia estava programada desde que o deputado assumiu a presidência da Câmara.
Na conversa, o chanceler explicou o papel do Itamaraty na aquisição das vacinas, alegando que há uma confusão sobre o que é responsabilidade do Ministério da Relações Exteriores e o que concerne ao Ministério da Saúde.
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O presidente do Progressistas, senador Ciro Nogueira (PI), outro crítico do chanceler, também participou da conversa, assim como o ministros da Comunicação, Fábio Faria, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos.
Segundo pessoas próximas, Bolsonaro avalia que já fez muitas concessões e dispensar Ernesto Araújo, um dos expoentes do ala ideológica — logo depois de demitir Eduardo Pazuello da Saúde e tirar Fabio Wajngarten da Secretaria de Comunicação — poderia desagradar a própria militância, base importante para a campanha da reeleição em 2022.
Araújo, que foi sabatinado e contestado ontem no Senado, tem sido alvo de críticas da classe política, que argumenta que o tom hostil do chanceler direcionado a países como a China atrapalham as negociações para aquisição de vacinas e insumos para o combate à Covid-19.
O núcleo de Bolsonaro acredita que, se o presidente mantiver uma mudança de postura em alta velocidade, com a saída de Araújo, poderá acabar perdendo a própria base mais fiel, eleitores que seriam o alicerce para o pleito do ano que vem e sem os quais até mesmo a ida para o segundo turno ficaria comprometida.
O próprio discurso de Bolsonaro na noite de terça-feira, mais sóbrio, chegou a ser criticado por alguns aliados próximos. Há uma avaliação de que o presidente se expôs desnecessariamente a panelaços e que o discurso mais cauteloso, adaptado para uma cepa mais perigosa do vírus, além de não convencer quem já o critica, causou estranheza ao eleitorado “mais raiz” do bolsonarismo.
Bolsonaro vem tentando se equilibrar para não ser visto como o responsável pelo alto número de mortes no país, mas, ao mesmo tempo, preocupa-se em não dar uma guinada de 180 graus, que poderia afetar sua base sem, por outro lado, atrair novos eleitores.