A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) divulgou uma projeção sobre as vendas da Páscoa em 2021: queda de 2,2% em relação a 2020. As consequências da pandemia podem explicar o fato de que menos brasileiros irão comprar ovos de chocolate – mesmo eles estando mais baratos que no ano passado.
O feriado deste domingo (28) é a quinta data comemorativa mais importante do varejo brasileiro . E deve movimentar R$ 1,62 bilhão em 2021 – o menor volume desde 2008.
O órgão aponta que dois fatores explicam a queda: a alta do dólar, que encarece importações, e a queda na renda das famílias.
Nos últimos 12 meses, a desvalorização cambial de 23% encareceu a importação de produtos típicos e reduziu suas compras. A quantidade importada de chocolates para a Páscoa deste ano foi de 2,90 mil toneladas, a menor desde 2013 (2,65 mil toneladas). Já a compra de bacalhau foi de 2,26 mil toneladas, a menor desde a Páscoa de 2009 (1,43 mil toneladas).
O Procon-SP constatou aumento no preço médio nos bombons de 7,38% e nos tabletes de chocolate de 8,95%. Os ovos, entretanto, tiveram queda no preço médio de 2,05%.
A queda nos ovos não foi homogênea. Os ovos de marcas acessíveis tiveram alta entre 10 e 15%. As marcas caras ou médias puxaram o índice para baixo, com quedas de preço acompanhadas de quedas no peso do produto, ou seja – na quantia de chocolate.
Das marcas mais populares, a Lacta foi a que registrou maior alta. Em 2020, o preço médio de um ovo Sonho de Valsa era R$ 34,73. Em 2021, o mesmo ovo custa R$ 41,26. Apesar do encarecimento, a Lacta foi uma das fábricas que diminuiu a quantidade de chocolate dos seus ovos.
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A Lacta afirma que faz apenas uma sugestão de preço, e o preço final fica sob decisão do lojista. Ainda assim, mesmo em sua loja on-line, a gramatura dos ovos e seus preços se elevaram entre 2020 e 2021.
“O custo do próprio chocolate, em geral, é impactado por diferentes fatores, e não somente pelo custo do cacau – o açúcar e o leite, por exemplo. No caso dos ovos de Páscoa, há de se considerar ainda um processo de produção de alta complexidade, custos de embalagem, armazenagem, marketing e logística. Os produtos de Páscoa demandam um processo de produção mais complexo. O trabalho tem início, em média, 18 meses antes da Páscoa. Por ser um produto sazonal e produzido somente em um período do ano, o processo produtivo é bastante “artesanal”, com ovos embalados manualmente, e até 6x mais funcionários na linha de produção”, justifica a marca, em nota.
Os ovos da Cacau Show se mantiveram nos mesmo preços do ano anterior. Os únicos produtos que encareceram foram os da “linha premium”, com alta de 5%, em média. Ainda assim, o presidente e fundador da empresa, Alê Costa, conta que o reajuste está abaixo da alta de preços dos insumos importados e matérias-primas, como os brindes e o próprio Cacau. Apesar da tendência de queda, Costa espera alta de 15% em relação a 2020.
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Em 2020, o ovo mais caro da Ferrero Rocher, de 350g, custava R$ 99,42 em média. Em 2021, o mesmo ovo custa R$ 96,50, apesar de ter perdido 20g de conteúdo.
A tendência é de que os outros produtos fiquem mais caros neste ano, com as altas esperadas no azeite de oliva, em 18,0%, bebidas alcóolicas, em 10,6%, e chocolates, em barra ou bombons, devem encarecer 7,0%.
De acordo com dados do Banco Central, 28,4% da renda dos brasileiros está comprometida com o pagamento de dívidas – o maior patamar da série, iniciada em 2005.
Ovo artesanal
Apesar da sutil queda no preço de alguns ovos, muitos brasileiros preferem comprar com os pequenos produtores artesanais. “É mais barato e bem mais recheado. Se eu fosse comprar no mercado o ovo que eu compro com a minha vizinha, ia pagar o dobro, e nem ia ser tão bom”, conta a biomédica Thamiris Gimenez, 31, que se declara chocólatra.
A vizinha dela é Camila Barbosa Pacheco, 32, moradora do Capão Redondo. Ela toca sozinha seu empreendimento pessoal há três anos, a Bolícias da Mila. A confeiteira conta que sua renda costuma dobrar na páscoa, já que além de bolos, ela produz ovos recheados durante o feriado e os meses seguintes.
Ela conta que, em 2020, teve faturamento de 70% a mais. Foram cerca de 280 pedidos de ovos. Na avaliação dela, a expectativa de que a quarentena fosse acabar logo e a população não ter perdido sua renda tão intensamente quanto no restante do ano fizeram com que seus clientes comprassem mais. “E também foi um período de mais compaixão, né? Todo mundo com medo do corona, acho que as pessoas decidiram presentar mais”, diz.
A segunda páscoa de pandemia, porém, está sendo mais difícil pra ela. Até a conclusão desta reportagem, Camila havia recebido 70 pedidos de ovos para o feriado de quatro de abril. Ela também conta que os preços aumentaram. “No ano passado, eu pagava R$ 30 no quilo do chocolate. Hoje eu já pago R$ 37 na barra”.
Ela conta que os laticínios em geral, que são seus principais ingredientes, encareceram muito no geral. Entre 2020 e 2021, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC-SP) da Fundação Getúlio Vargas registrou uma variação de 6,13%. Só entre fevereiro e março deste ano, a alta dos preços de alimentos básicos, como os derivados do leite, foi 1,30%.
Até 2019, o brasileiro vinha consumindo cada vez mais chocolate e bacalhau na páscoa. No primeiro ano da série histórica, 2005, o comércio varejista movimentou R$ 1,25 bilhão durante a semana anterior à páscoa e o fim de semana do feriado. Até o último ano antes da pandemia, as vendas vinham registrando altas subsequentes, e em 2019 o valor total bateu R$ 2,33 bilhão. Em 2020, a queda foi de 28,7%, e o mercado movimentou R$ 1,66 bilhão.
O presidente da CNC, José Roberto Tadros, afirma que os impactos da pandemia na renda da população e o fechamento do comércio às vésperas do feriado explicam a baixa expectativa. “Esse é um segmento que, historicamente, depende de um consumo presencial. Ainda há uma grande dificuldade de adaptação das vendas on-line para a compra de itens como chocolate, ovos de Páscoa e produtos de supermercado, apesar de todos os avanços já feitos pelas empresas”.