O Instituto Butantan anunciou nesta sexta-feira (26) o desenvolvimento e a produção-piloto da primeira vacina 100% brasileira contra o novo coronavírus (Sars-CoV-2), a ButanVac. O imunizante vai usar tecnologia semelhante à da CoronaVac e a expectativa é de início dos testes clínicos em humanos em abril deste ano, após autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
“O pedido de autorização para o início dos testes clínicos em humanos deve ser entregue à Agência Nacional de Vigilância Sanitária no decorrer do dia de hoje”, informou Dimas Covas, presidente do instituto de pesquisa. Segundo ele, os testes clínicos de fase 1 e 2 em humanos devem ser iniciados em abril. “Queremos concluí-los em até dois meses. Em maio, quando a produção da vacina da gripe estiver terminada, já poderemos começar a produzir a ButanVac”, acrescentou.
O que se sabe sobre a nova vacina contra a Covid-19?
Apesar do anúncio de hoje, ainda há poucos detalhes sobre o processo de desenvolvimento da vacina. De acordo com o Butantan, os trabalhos com a ButanVac tiveram início em março de 2020.
A promessa é de que a ButanVac será uma vacina desenvolvida e produzida integralmente no Butantan, sem necessidade de importação do IFA (Insumo Farmacêutico Ativo). Os resultados dos testes pré-clínicos realizados com animais se mostraram promissores, o que permite evoluir para estudos clínicos em humanos.
Se tudo correr bem, o instituto promete disponibilizar 40 milhões de doses a partir de julho. A capacidade de produção pode chegar a 100 milhões por ano.
A iniciativa do novo imunizante faz parte de um consórcio internacional do qual o Instituto Butantan é o principal produtor, responsável por 85% da capacidade total, e tem o compromisso de fornecer essa vacina ao Brasil e aos países de baixa e média renda. A produção-piloto do composto já foi finalizada para aplicação em voluntários humanos durante os testes.
Qual a tecnologia da ButanVac?
O imunizante brasileiro vai utilizar a mesma tecnologia que já é aplicada na vacina da gripe. O Instituto Butantan, que ficará responsável por sua fabricação, domina completamente essa plataforma: é o maior produtor do imunizante contra a gripe na América Latina e entrega 80 milhões de doses anualmente.
Segundo Dimas Covas, o vetor utilizado é um vírus chamado Newcastle, que infecta aves. Os pesquisadores injetam nesse vírus os genes da spike do coronavírus, como é chamada a proteína que se encaixa nas células humanas para promover a infecção. Depois de modificar o vírus Newcastle com a proteína do coronavírus, ele é introduzido em ovos de galinha, onde se multiplica.
“É uma vacina produzida em ovo embrionário, mas ela se utiliza da estrutura básica de um vírus, de um vírus que infecta aves, chamado Newcastle. Esse vírus foi modificado geneticamente e ele expressa a proteína S”, explicou Covas. “Só que essa proteína S é uma super proteína S. Ela desenvolve imunidade de uma forma muito mais efetiva que essas outras vacinas no mercado que usam a proteína S”, acrescentou o presidente do Butantan.
Você viu?
O vírus da doença de Newcastle não causa sintomas em seres humanos, constituindo-se como alternativa muito segura na produção. O vírus é inativado para a formulação da vacina, facilitando sua estabilidade e deixando o imunizante ainda mais seguro.
A vacina pode ser aplicada em uma dose?
Os pesquisadores ainda não sabem se vacina será distribuida em uma ou duas doses. Segundo o presidente do Butantan, Dimas Covas, a vacina é mais imunogênica do que as anteriores. Isso significa que ela tem capacidade de fazer o sistema de defesa do corpo criar defesas de forma mais eficiente contra o coronavírus.
Os pesquisadores testarão a resposta imunológica dos participantes a diferentes doses e com intervalos variados. Dimas Covas afirmou que a vacina em dose única é uma “possibilidade”. “Essa é uma possibilidade. Vamos avaliar doses diferentes e intervalos de doses também. Essas respostas teremos após a fase inicial dos estudos em humanos.”
A nova vacina é segura?
Ricardo Palacios, diretor médico de pesquisa clínica do Instituto Butantan, explicou que a nova vacina brasileira terá perfil alto de segurança. “Nós sabemos produzir a ButanVac, temos tecnologia para isso, e sabemos também que vacinas inativadas são eficazes contra a Covid-19. Poder entregar mais vacinas é o que precisamos em um momento tão crítico”.
Apesar disso, nenhuma publicação sobre o desenvolvimento da vacina ou resultados de testes em fases pré-clínicas foi feito em revista científica até o momento.
Qual será o preço?
O Instituto Butantan ainda não sabe qual será o custo por dose de imunizante. “As vacinas que usam essa tecnologia são muito baratas”, diz Covas. Ele explica que não há recursos do ministério da Saúde no projeto e que o governo federal não foi avisado sobre o desenvolvimento da ButanVac.
A ButanVac protege contra as novas variantes?
O presidente do Butantan disse que pesquisadores já estão utilizando os aspectos genéticos da variante brasileira de Manaus, a P.1, nas pesquisas para produzir a ButanVac. De acordo com o instituto, a ideia é que a vacina seja capaz de proteger a população contra a P.1. Se necessário, a ButanVac poderá ser adaptada as novas cepas, disse Covas. “Estamos trabalhando na vacina com a variante P1. Se for necessário, sim (adaptaremos para outras variantes)”, afirmou.
Etapas de desenvolvimento de uma vacina
Pesquisa básica e testes não clínicos Nessa etapa, a partir de testes em laboratório (chamados in vitro) e com animais, o objetivo é pesquisar a segurança da vacina e sua capacidade de gerar anticorpos. Alguns testes com animais também podem ser realizados em paralelo com a próxima etapa. Estudos clínicos Esses estudos são realizados com seres humanos depois de obtidos dados e informações significativos na etapa anterior. O protocolo desses estudos clínicos precisa ser avaliado e aprovado pela Anvisa antes da sua execução. Fase 1 Essa é a primeira etapa de testes em humanos para avaliar a segurança e possíveis reações indesejáveis no local da aplicação da vacina ou no organismo. Nessa fase também pode ser verificada, de forma preliminar, a imunogenicidade da vacina, ou seja, sua capacidade de gerar anticorpos contra o novo coronavírus.
Fase 2 Chegou a hora de avaliar a dose, a forma de vacinação e a capacidade de gerar anticorpos (contra o novo coronavírus) na população (faixa etária, por exemplo) que deverá ser indicada para receber a vacina. A segurança continua em análise aqui. Fase 3 Os testes nessa etapa são realizados em grandes populações para avaliar a segurança e a eficácia da vacina. A vacina precisa provar que, de fato, é capaz de nos proteger da doença. Registro Profissionais especializados da Agência vão revisar todos os documentos técnicos e regulatórios e verificar os dados de segurança e eficácia, bem como avaliar a qualidade da vacina. O registro, concedido pela Anvisa, é o sinal verde para que a vacina seja comercializada e disponibilizada no país.