Acreano gosta de política. Eu prefiro a literatura. Mas vez por outra vejo similaridades entre uma e outra. A vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida, conforme frase do escritor Oscar Wilde.
Se o leitor, por exemplo, quiser entender como funcionam os regimes comunistas, basta que leia o romance A Revolução dos Bichos, de George Orwell. Assim como as fábulas de la Fontaine valem mais do que muitos tratados de psicologia.
Pra minha infelicidade, preciso dedicar mais tempo e energia aos assuntos políticos, em detrimento da evolução de uma modestíssima cultura literária.
Vejo, por exemplo, que por esses dias o vereador Emerson Jarude tem falado pelos cotovelos. Num dia sugere a criação de uma Guarda Municipal, para no outro exigir a construção de mais dois restaurantes populares em Rio Branco.
Jarude é de uma família de empreendedores. Sabe muito bem que dinheiro não dá em árvore. Como parlamentar de um município falido, no qual abundam os problemas e minguam os recursos, ele deveria ser mais comedido no discurso – e menos populista nas proposições.
Os desvarios do parlamentar rio-branquense me lembram as histórias surreais do romance Alice no País das Maravilhas. Jarude, decididamente, tem agido como o Chapeleiro Maluco, um dos célebres personagens da obra de Lewis Carroll.
Há uma cena que me parece perfeita para explicar a similaridade aqui pretendida: o Chapeleiro Maluco festeja um dos seus desaniversários com a Lebre de Março, quando Alice chega ao local acompanhada do Coelho Branco.
Em dado momento, o Chapeleiro Maluco agarra o relógio do Coelho e diz: “Dois dias atrasado”.
Ele mergulha o instrumento no chá e em seguida o abre para descobrir a complexidade do mecanismo. Então passa a retirar com um garfo os pivôs, eixos e molas. Na tentativa de corrigir o próprio disparate, enche o relógio com uma mistura feita de manteiga, açúcar e limão. E o devolve ao desolado Coelho Branco.
Jarude é um sujeito carismático e gentil, como também o é personagem de Carroll. O problema do parlamentar é querer consertar um mecanismo sobre o qual ele não faz a mínima ideia de como funciona.