Estar sozinho em um bar pode ser uma janela aberta ao infinito… tudo pode acontecer, ou simplesmente nada. Um bêbado chato pode acabar com a sua tarde ou noite, já um bêbado legal pode ser uma agradável companhia, ou você pode passar alguns instantes passeando solitário em seus pensamentos, projetos, dores e amores.
Eu, de quando em vez, costumo ir ao bar sozinho. Na verdade, tenho feito isso com muita frequência nos últimos anos. Um tempo meu comigo em um dos ambientes onde me sinto completamente à vontade. Quando a música me agrada então…
O Bar do Zé era desses lugares onde a cerveja era sempre gelada, a música boa e a comida divina.
Após pedir uma Brahma e uma porção de filé acebolado ao Zé, dei uma olhada, como de costume, aos frequentadores do bar naquela tarde de terça-feira.
Na mesa ao lado, dois caras conversavam sobre música. Um deles parecia um professor de história, filosofia ou algo assim… fumava muito. O outro, pelos trejeitos e forma como usava o braço direito ao falar, tal qual empunhasse uma batuta, parecia ser um maestro. Eles bebiam cerveja e debatiam sobre música brasileira, um dos meus assuntos favoritos. Logicamente, concentrei minha atenção no papo deles.
O que aparentava ser um historiador, deu um profundo trago em seu cigarro e bradou:
-Adoro Chico Buarque, mas o Belchior é o maior músico de MPB de todos os tempos.
-Belchior é fantástico, mas o Chico Buarque de Holanda é o maior artista do Brasil. Eu sou um “chicólotra” assumido, disse o “maestro”.
Amei a expressão do “regente”. Eu também me considero um “chicólotra”, embora seja fascinado pelo Antônio Carlos Belchior, um dos integrantes do “Pessoal do Ceará”, ao lado de artistas como Raimundo Fagner, Amelinha e Ednardo. “Pessoal do Ceará” foi como ficou conhecido um grupo de artistas cearenses que despontaram no cenário cultural brasileiro no início da década de 1970.
O disco Alucinação, de Belchior, lançado em 1976, é considerado por muitos críticos musicais como um dos mais revolucionários da história da MPB. Entre seus principais sucessos estão “Apenas um Rapaz Latino Americano”, “Como nossos Pais” e “A Palo Seco”.
No mesmo ano, Chico Buarque conquistava o seu primeiro disco de ouro com o LP “Meus Caros Amigos”, álbum que tem a participação de Milton Nascimento na faixa “O que será”, um dos maiores sucessos do artista carioca. O disco conta ainda com obras-primas com “Mulheres de Atenas” e “Olhos nos Olhos”.
O ser humano tem uma necessidade natural de categorizar e organizar “em prateleiras” o mundo ao seu redor. Comparar pessoas é uma extensão disso, permitindo estabelecer padrões e diferenças. Meu filho adolescente, por exemplo, não consegue simplesmente me perguntar se eu acho algum jogador de futebol craque. Sempre pergunta: “pai, você acha que fulano é maior que beltrano? ”
Eu que não sou muito afeito a comparações, e sou apaixonado por Chico e Belchior, assim como por tantos outros artistas incríveis da nossa música, parei de prestar atenção no inócuo debate do “maestro e do “professor” e pedi ao Zé mais uma cerveja e para colocar na vitrola “Como Nossos Pais”, música de Belchior imortalizada por Elis Regina.
Chico Buarque ou Belchior, quem foi maior? Ah… que se dane!