Havia muito tempo que não encontrava com o Seu José. Tio Zeca, como carinhosamente o chamávamos, era um senhor de pouco mais de 60 anos. Cabelos brancos na altura do ombro e cavanhaque igualmente branco. Usava sempre camisa de alguma banda de rock e um cordão com um crucifixo enorme para fora da camisa. Era a sabedoria em pessoa. Educado e elegante nas palavras. Um simples “passeio” de elevador em sua companhia era uma aula sobre a vida.
Naquele dia, ao sair do elevador, encontro com ele na portaria, batendo papo com o Francisco, zelador do prédio.
– Bom dia, tio Zeca. Bom dia, Francisco.
– Bom dia – respondeu o zelador.
Tio Zeca nada falou antes de me pegar carinhosamente pelo braço e abrir um sorriso sincero.
– Meu rapaz, li o seu artigo sobre a crise da meia-idade e gostei bastante.
– Obrigado – respondi, seguido de um sorriso tímido.
– Mas se você acha que a crise da meia-idade é difícil, imagine a crise da “idade inteira”.
O sorriso dessa vez foi ainda mais tímido que o anterior.
– Um abraço, tio Zeca. É sempre bom revê-lo.
No artigo que escrevi sobre a crise da meia-idade, que fora mencionado por tio Zeca, transcorri sobre o quão difícil é quando constatamos que temos mais tempo para trás do que para a frente. Mais retrovisor que para-brisa… mais passado do que futuro.
A frase do tio Zeca me ecoou durante dias inteiros. Se passar dos quarenta anos de idade não é fácil, como deve ser passar dos sessenta? E dos setenta? Quando é nítido que a estrada está chegando ao seu final, que a viagem está prestes a terminar.
Lembrei de um artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que havia lido há poucos dias no jornal. Ele fazia projeções de um Brasil daqui a vinte anos. Quanta lucidez para um senhor que está prestes a completar nove décadas de vida. Como deve ser imaginar um futuro do qual não faremos parte? Será essa a “crise da idade inteira”, da qual tio Zeca se referia?
Percebo que quando a pessoa ultrapassa os sessenta anos de idade é como se ela perdesse a sua identidade e fosse alocada em um grupo comum: o da terceira idade, ou feliz idade, ou melhor idade, enfim, o nome que se queira dar a esse período da vida que funciona como o marco inicial da etapa final de sua existência. Você acha que vivemos em uma sociedade que cultua a juventude e olha com indiferença para nossos velhos? Você olha com indiferença ou preconceito para nossos idosos?
Quando era guri, um amigo de infância perguntou ao meu avô quais eram as suas perspectivas de vida aos 77 anos de idade. Meu avô lhe respondeu de imediato: “Estou em uma fase da vida que o que vier é lucro”.
O ator teatral americano John Barrymore disse que “O homem começa a envelhecer
quando as lamentações começam a tomar o lugar dos sonhos”. Quais são os seus sonhos para quando envelhecer? Já envelheceu? E a “crise da idade inteira” mencionada pelo tio Zeca, existe? Como é?