Todo fanatismo é ruim, mas o fanático político vai além: é chato e agressivo

Domingo de sol quente. Saí de manhã bem cedo para exercer o meu direito de cidadão. Votar. Mas se o voto é obrigatório, fica a pergunta: exercer o direito ou cumprir o dever? Nunca entendi bem o fato de o voto ser obrigatório e as propagandas da TV dizerem ser um direito. Como é um direito se eu não posso negá-lo? Mas enfim, tem coisas no Brasil que nem Freud conseguiria explicar. Ao entrar no elevador dou de cara com o vizinho do 9° andar, acho que é Leonardo o nome dele. Sou péssimo para nomes.

– Bom dia, meu amigo.

Falei, usando o truque habitual de sempre colocar um adjetivo no lugar do nome da pessoa.

– Bom dia!

Disse entusiasmado e sorridente.

– Você já votou? Ele me perguntou.

– Ainda não, estou indo, respondi, sem perceber os dois adesivos em seu peito, com a foto e número de um candidato. 

Essa distração me custou intermináveis andares de uma “palestra” enfadonha sobre o porquê eu ter que votar em tal candidato. Antes mesmo de o elevador chegar ao térreo e a chata “palestra” acabar, me dei conta de que eu também houvera sido assim um dia. Um militante aguerrido, ou quem sabe, um fanático político. O que difere um do outro?

Me despedi com um sorriso e um balançar de cabeça. Em uma sincronia perfeita com sua fala, que deram a nítida impressão de que eu concordava com tudo que ele dizia. É como se estivesse mentindo sem emitir uma única palavra. E fui embora a pensar. Acredito que o fanatismo político nasce no vazio de ideias, na busca constante por um inimigo, que alimenta a irracionalidade maniqueísta do “nós ou eles”.

Esses tontos fanáticos talvez nem saibam o que defendem. E nem o porquê. Mas acreditam que o adversário, que para eles é um inimigo, só está na política para fazer o mal. Ao contrário do seu candidato, que para eles é o que tem de mais honesto e preparado para vencer a eleição. O resto é porcaria e escória.

Os fanáticos políticos são incapazes de interagir civilizadamente e respeitar seus adversários porque negam a estes o valor mais elementar: a dignidade humana. Assassinam reputações, esquecem que os “inimigos-adversários” também têm família. Para eles vale tudo para ganhar a eleição e “salvar” nossa cidade, estado ou país de mãos tão inescrupulosas. Acreditam fazer o que fazem “pelo bem das pessoas”. Você conhece alguém assim? Já tentou dizer que não vota no seu “candidato-ídolo”? Caso já tenha feito isso, sabe exatamente o que estou dizendo. Se ainda não fez, aconselho não fazê-lo. A não ser que tenha uma tarde inteira para ouvir um sermão sobre as “canalhices” do seu candidato. Dele e de pelo menos três gerações passadas de sua família. 

O dramaturgo, escritor e jornalista Nelson Rodrigues disse que “nada é mais cretino e cretinizante do que a paixão política. É a única paixão sem grandeza, a única que é capaz de imbecilizar o homem”.

A linha que separa o militante político do fanático é muito tênue e, às vezes, dificulta a nossa capacidade de diferenciar um do outro. O militante é importante no regime democrático e salutar ao debate. O fanático apenas um chato que não consegue falar de outro assunto que não seja o quão ruim é o seu candidato, quando este difere do dele, logicamente. Você conhece alguém assim? Perdoe-o. Assim que passa o período eleitoral, na maioria das vezes, eles voltam a conviver bem em uma sociedade plural.

E aí, já tem candidato para esta eleição? Podemos conversar civilizadamente sobre o assunto? Ou melhor deixarmos para mês que vem?

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